Não é seca, é saque: Querétaro, “o vale dos centros de dados”
Por Paola Ricaurte Quijano, Teresa Roldán Soria. Querétaro, MÉXICO.
Ilustração: Giovanna Joo
ÁGUA
Introducción
O auge mundial da indústria de centros de dados, impulsionado pelas demandas do crescente investimento no desenvolvimento e implantação de sistemas de IA, apresenta configurações específicas nos contextos locais. Na maior parte do mundo, forças geopolíticas se cruzam com dinâmicas territoriais históricas. Querétaro é um exemplo paradigmático de como essas dinâmicas expressam tensões entre diversos atores: de um lado, corporativos e governamentais e, de outro, as comunidades que habitam esses territórios – em particular os povos originários e as comunidades camponesas – e a sociedade civil organizada.
Os mecanismos de expropriação dos bens comuns utilizados no ciclo de vida da IA reproduzem heranças históricas e coloniais no nível infraestrutural. Por isso, é necessário abordar os múltiplos impactos socioambientais dos centros de dados de maneira estrutural, como parte de uma indústria emergente típica de um modelo de desenvolvimento tecnológico imposto pelos centros imperiais.
A partir da análise do caso da indústria de centros de dados em Querétaro, México, este texto oferece uma crítica político-ecológica, descolonial e feminista, baseada no exame dos impactos dessa indústria, da continuidade das formas de expropriação e de resistência comunitária, e da possibilidade de intervenções a partir de um marco de direitos humanos e justiça social. O fenômeno dos centros de dados é complexo e, por isso, requer a exploração de suas dimensões históricas, econômicas, geopolíticas, legais, infraestruturais e ambientais, mas também do caráter sociocultural, étnico-racial, de gênero e de classe dos impactos daquela indústria.
Querétaro é um território marcado por uma história colonial de desapropriação que se estende até hoje (Valverde, 2009; Valdovinos & Romero, 2025). O impacto da indústria de centros de dados em Querétaro transcende o consumo intensivo de água e energia; implica um impacto direto na possibilidade de subsistência material e social de populações precárias, racializadas e, em particular, das mulheres que historicamente têm estado na linha de frente da defesa da água e do território. A indústria, ademais, ameaça as cosmovisões ancestrais dos povos originários, as formas comunitárias de governança e a propriedade coletiva da terra e dos bens comuns.
Aqui, propomos três perspectivas para tratar da crise socioambiental enfrentada por Querétaro: (1) uma abordagem ecopolítica, que reconhece a natureza relacional da infraestrutura dos centros de dados como resultado de processos históricos, políticos, econômicos e sociais de longa duração e em diferentes escalas, que vão desde as forças geopolíticas até as micropolíticas; (2) uma perspectiva feminista e descolonial, que joga luz sobre as dimensões do poder e os impactos diferentes sofridos pelas populações a partir de suas características (origem étnico-racial, nível socioeconômico, nível educacional, idioma, etc.); e (3) uma perspectiva dos direitos humanos e da justiça socioambiental, respeitosa das cosmovisões e da autodeterminação dos povos, que reconhece o direito das gerações presentes e futuras a uma vida digna e a um ambiente saudável.
Uma visão ecopolítica, feminista e descolonial dos centros de dados
Nos últimos anos, a análise dos impactos socioambientais dos centros de dados tem se orientado principalmente pelo consumo de água, energia e emissões de carbono (Gröger et al. 2025, Lehuedé, 2025, Siddik et al. 2021). Aqui, propomos evitar a fragmentação das variáveis socioambientais e abordar a multidimensionalidade dos impactos nos territórios localizados. Uma abordagem socioambiental não pode se concentrar apenas no consumo intensivo de recursos, sob pena de reduzir a complexidade dos impactos.
No México, um país marcado pela desigualdade, violência, racismo sistêmico e herança das lógicas neoliberais, é necessário considerar o contexto histórico, econômico, político, sociocultural e territorial na análise das consequências dessa indústria para comunidades específicas, como parte de uma linha de continuidade histórica y sistémica da expropriação. Caso contrário, a análise dos impactos ambientais pode resultar em soluções simplistas próprias do capitalismo verde, que deixarão de fora as causas reais e os efeitos duradouros que o desenvolvimento da indústria de centros de dados acarreta para as comunidades e os territórios.
O estudo dos impactos deve considerar a rede de relações históricas, políticas, geopolíticas, econômicas e socioculturais, atravessadas por assimetrias de poder que produzem efeitos variados para as pessoas que habitam o território e que são afetadas pela construção e operação dessas infraestruturas a curto, médio e longo prazo. Assim, uma abordagem ecopolítica levanta a importância de situar as infraestruturas dentro de seus contextos socioecológicos mais amplos. Destaca as experiências vividas pelas pessoas afetadas, as dimensões históricas da mudança tecnológica e as economias políticas que definem quais infraestruturas são construídas, onde, para quem e a que custo. Essa perspectiva implica prestar atenção às possibilidades de resistência popular e comunitária que possibilitem a reconfiguração sociopolítica e infraestrutural do território (Ricaurte, 2026).
Se fizermos esse percurso histórico, podemos reconhecer que, desde a invasão colonial, no território que hoje ocupa Querétaro, a água tem estado no centro das disputas de poder. Após cinco séculos, podemos observar que a história continua se repetindo e que os mecanismos de desapropriação não mudaram de forma substancial. Embora as narrativas se concentrem na escassez de água – um elemento que na cosmologia indígena é sagrado –, as comunidades não se deixam enganar: a crise ecológico-social – da água, da vida e do território – que Querétaro enfrenta hoje é, na verdade, o resultado de séculos de implementação de mecanismos que buscaram converter um bem comum em um recurso privado. Por isso, no México, os defensores da água, da vida e do território apontam a raiz do problema: “Não é seca, é pilhagem”.
Entendemos que o boom mundial da indústria de centros de dados é uma expressão material do capitalismo racial (Robinson, 2000) e de uma ordem colonial-patriarcal (Lugones, 2010) que privilegia os interesses do mercado em detrimento do bem social, buscando a acumulação capitalista por meio da expropriação. A indústria de centros de dados é uma expressão da colonialidade. É parte de um modelo neoliberal de desenvolvimento tecnológico, baseado numa visão de sociedade que privilegia as elites locais e transnacionais – masculinas, hetero patriarcais e brancas – à custa da destruição das formas de vida das comunidades feminizadas, racializadas e precárias. Por isso insistimos que as resistências a esses projetos fazem parte das lutas históricas das comunidades pela defesa dos bens comuns, do território e da água, bem como das formas comunitárias de vida e organização social que remontam à era colonial.
Uma abordagem descolonial e feminista centrada nos direitos humanos e na justiça socioambiental busca tornar visível a continuidade histórica da violenta expropriação nos sistemas capitalista, colonial e patriarcal, que lançam mão diversos mecanismos para a acumulação de riqueza (legais, institucionais, infraestruturais, discursivos, socioculturais, coercitivos, etc.). Esses impactos têm dimensões de gênero, étnico-racial, de classe e outras, que afetam o acesso a direitos específicos. No México, a abordagem permite tornar visíveis as realidades dos territórios e as experiências dos grupos sociais que se mobilizam contra os centros de dados, dentro de um horizonte histórico mais amplo de luta.
Querétaro: a história da industrialização e privatização dos bens comuns
Querétaro, um pequeno estado no centro do México (Figura 1), tem uma paisagem geográfica e ecologicamente diversificada, que varia de desertos a florestas tropicais. O estado faz parte do grande vale do México, que era habitado há nove mil anos por grupos de povos otomíes, purépechas, chichimecas, nômades e agricultores que se estabeleceram em terras em que podiam cultivar, trabalhar metais, têxteis, caçar e oferecer tributos aos senhores que governavam a região. Normalmente, os locais que ocupavam ficavam próximos a fontes de água.

A partir da invasão dos colonizadores, os diferentes povos foram subjugados ou colaboraram na conquista de territórios para obter privilégios. Entre eles, encontravam-se alguns senhores otomíes, que habitavam a zona e contribuíram para deslocar outros grupos para áreas vizinhas. Os colonizadores utilizaram diversos mecanismos para gradualmente acumular as melhores terras e fontes de água. Querétaro era um local estratégico, pois ficava no caminho entre as minas de prata de Zacatecas e Guanajuato e a Cidade do México.
Desde a época colonial, várias atividades produtivas se desenvolveram na região. No início, eram a agricultura, a pecuária e a indústria têxtil. À medida que a atividade econômica se expandia, cada indústria requeria mais terra, infraestrutura, tecnologia, mão de obra e fontes de água. Por isso, os colonizadores criaram instituições, leis e infraestruturas para permitir a apropriação e a privatização da terra e da água.
Com a revolução mexicana de 1910 e a subsequente reforma agrária, estabelecida na Constituição de 1917, esse impulso privatizador das terras iniciado durante o período colonial sofreu uma reversão temporária. Reformas possibilitaram o retorno a esquemas comunitários de propriedade da terra com o respectivo acesso às suas fontes de água. No entanto, a partir do século XX, em particular durante a era neoliberal no México, procurou-se eliminar qualquer obstáculo que freasse o livre mercado, o que acarretou a privatização intensiva dos bens comuns.
Assim, Querétaro, após uma longa sequência de governos neoliberais, transformou-se em um local ideal para a atividade empresarial, que se consolidou acumulando recursos. Em particular, nas últimas duas décadas, o estado tornou-se um polo de desenvolvimento automotivo, aeroespacial e eletrônico, com a criação de parques industriais como espaços facilitadores da industrialização. Nos últimos anos, a indústria de centros de dados se posicionou como um novo objeto da narrativa que consolida a vocação empresarial e industrializadora do governo estadual (Valdivia, 2024, The Maybe, 2025). A chegada acelerada dos centros de dados intensificou a pressão sobre os ecossistemas (Baptista e McDonnell, 2024) e aprofundou padrões históricos de desigualdade e desapropriação, particularmente em relação as formas de propriedade social da terra (como os ejidos e as comunidades agrárias que foram instituídos como parte da Reforma Agrária mexicana, surgida após a Revolução de 1910), as áreas protegidas, fontes de água e acesso à energia.Entraram em tensão forças incompatíveis que disputam as infraestruturas dos centros de dados. De um lado, as forças econômicas e políticas globais do modelo de desenvolvimento impulsionado pelos países altamente industrializados e endossado por organismos internacionais que se articulam com os interesses econômicos e políticos locais. De outro lado, as forças comunitárias do território, com formas particulares de diferenciação que disputam o modelo hegemônico de desenvolvimento tecnológico e, portanto, o modelo de mundo que o mercado livre reproduz. No México, isso envolve as formas sociais de propriedade da terra (ejidos), a governança dos bens comuns, a organização social comunitária e as práticas de sustentação da vida enraizadas no território.
Querétaro: “O vale dos centros de dados”
Querétaro se consolidou como o principal centro de dados do México, concentrando 65% da capacidade nacional e mais de 80% dos investimentos já realizados e os previstos para os próximos anos. Segundo estimativas conservadoras, a partir dos dados disponíveis, os investimentos podem ascender a mais de US$ 13 bilhões (DCD, 2024, Mexico Now, 2023, Research and Markets, 2025). O estado de Querétaro abriga 27 projetos de centros de dados (Figura 2).

Desses, 18 centros estão em operação, com uma capacidade estimada de mais de 600 MW para 2025 (Baxtel, 2025), dos quais pelo menos 13 em hiperescala, pertencentes às empresas Amazon (AWS), Microsoft, Google, Oracle, Odata, Equinix (MX3), Digital Realty, CloudHQ, Scala. Outros centros de dados tradicionais são operados pela IBM, KIO Networks, Axtel/Alestra, Equinix (MX1/MX2) (Tabela 1).
Empresa | Projeto/Local | Investimento anunciado (USD) | Área (m²) | Capacidade (MW) |
ODATA | QR04 | 24 | ||
ODATA | DC QR03 (campus) | $3,000,000,000 | 275,000 | 300 |
ODATA | QR01 | $80,000,000 | 52,350 | 32 |
ODATA | QR02 | 22,373 | ||
CloudHQ | QRO Campus (Colón) | $3,400,000,000 | 253,068 | 288 |
Digital Realty/Ascenty QRO1 | MEX01 | 20,000 | ||
Digital Realty/Ascenty QRO2 | MEX02 | 23,969 | 31 | |
Digital Realty/Ascenty QRO3 | MEX03 | 20,000 | 21 | |
KIO Networks | QRO1 | 4,108 | 6 | |
KIO Networks | QRO2 | 12,917 | 12 | |
KIO Networks | QRO3 | $400,000,000 | 25,000 | |
ORACLE | Mexico Central MX-Queretaro-1 | |||
Equinix | MX1 – Querétaro | 10,000 | ||
Equinix | MX2-Querétaro | 7,400 | ||
Equinix | Mexico City 3x-1 | $140,000,000 | 4 | |
AWS (Amazon Web Services) | Região AWS México (Central) – cluster em Querétaro | $5,000,000,000 | ||
Microsoft (Azure) | Região México Central – área metropolitana de Querétaro | $1,100,000,000 | ||
Google Cloud | Região do Google Cloud em Querétaro | |||
Total | USD 13,120,000,000 | 726185.36 | 694 |
O México é o segundo maior mercado de centros de dados depois do Brasil, mas, devido ao seu rápido crescimento, estima-se que em breve a diferença entre os dois países será reduzida (Mensky et al. 2024). Em 2024, o México representava aproximadamente 2% do mercado global de gestão de ativos de centros de dados. Se prevê que o mercado nacional atinja US$ 2,260 milhões até 2030, com uma taxa composta anual de crescimento de 13,5% (Expansión, 2025). De acordo com a Associação Mexicana de Centros de Dados, estima-se que, até 2029, o setor contribuirá com 5,2% do PIB nacional, o equivalente a US$ 73,536 bilhões (Expansión, 2025).
Os mecanismos da expropriação
A rodovia que liga a Cidade do México a Querétaro mostra a relação entre industrialização e infraestrutura: enormes caminhões circulam sem parar, tornando intimidante trafegar por lá. Muito antes de chegar à capital do estado (de mesmo nome), placas espetaculares anunciam a venda de imóveis, terrenos e naves industriais. No estado, tudo parece estar à venda. A convergência de processos históricos de industrialização, pressões demográficas e novas formas de acumulação capitalista no setor tecnológico, no território, geraram uma crise socioambiental sem precedentes. A configuração territorial encontra-se em um ponto de inflexão crítico.
O boom atual dos centros de dados em Querétaro não é uma ruptura, mas a evolução de padrões de industrialização concertados pelo Estado e – até agora – pelos governos neoliberais. Embora a história possa ser rastreada até a era colonial, foi a partir do século XIX que se consolidou no estado uma vocação para o investimento estrangeiro, com o fornecimento estatal de infraestrutura industrial e a exploração de recursos locais para os mercados externos.
Por isso, sustentamos que a transformação acelerada de Querétaro em um polo da indústria de centros de dados é resultado de um processo de desapropriação de longa duração – que se deu por vários mecanismos nos âmbitos político-jurídico, institucional, econômico-fiscal, discursivo-narrativo, infraestrutural e coercitivo. Alguns elementos dessa complexa trama de desapropriação são as políticas neoliberais e as leis “do livre mercado” que possibilitaram as privatizações, a promoção do investimento estrangeiro direto, a isenção de impostos, o uso privado da infraestrutura pública, a opacidade corporativa e governamental, e o exercício da força e da coerção policial. Tudo combinado à narrativa do desenvolvimento econômico.
Nesta seção, revisaremos brevemente alguns desses mecanismos.
As políticas neoliberais
As políticas neoliberais implementadas desde 1982, sob os governos de Miguel de la Madrid e Carlos Salinas de Gortari, favoreceram o livre mercado. A privatização em massa de empresas estatais, a desregulamentação financeira e, especialmente, a assinatura do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) em 1994, direcionaram a economia mexicana para a manufatura de exportação e a atração de investimento estrangeiro direto. Querétaro desenvolveu clusters automotivos e aeroespaciais que prepararam o terreno para a revolução digital (Governo do Estado de Querétaro, 2023). Em particular, o setor aeroespacial, desenvolvido intensivamente desde o início do século, foi crucial para o surgimento dos atuais centros de dados.
Com mais de 50 empresas aeroespaciais (Bombardier, Safra, FE, Rolls Royce) e investimentos de 292,8 milhões (2006-2024), o setor criou infraestrutura especializada, força de trabalho qualificada e impulsionou marcos regulatórios que facilitaram a transição posterior para tecnologias digitais. A Universidade Aeronáutica de Querétaro (2007) e o Centro Nacional de Tecnologias Aeronáuticas (2018) resultam de investimentos estatais em formação técnica que hoje o setor tecnológico capitaliza. A construção do novo aeroporto também responde à necessidade de facilitar as conexões com outros mercados (García, 2024).
Assim, a rápida industrialização das últimas décadas criou as condições infraestruturais necessárias para que Querétaro emergisse como um nó na expansão global de centros de dados. Multinacionais como Microsoft, Amazon e Google, bem como operadores especializados (KIO Networks, Equinix, Ascenty/Digital Realty, ODATA) investiram recursos estimados em US$ 12 bilhões (cifras conservadoras, já que muitos dos investimentos não são divulgados publicamente) para estabelecer o que as autoridades chamam de “vale dos centros de dados” ou o que o CEO da Microsoft, Satya Nadella, batizou de “região de IA”. As narrativas oficiais identificam o influxo de capital e infraestrutura como crescimento econômico (AM Querétaro, 2023), mas o rápido crescimento desencadeou profundos conflitos ecológicos, sociais e políticos e agravou as disputas históricas por terra e água.
A transformação de Querétaro em polo da indústria de centros de dados responde a uma estratégia traçada pelo governo estadual liderado pelo empresário Mauricio Kuri (2021-2027), do Partido Ação Nacional, para atrair investimento estrangeiro direto digital: isenções fiscais, permissões aceleradas, coinvestimentos em infraestrutura e fornecimento de terras para a indústria (Caballero, 2024; Estrella, 2024). Na mídia, o governador se gabava de ter visitado Washington, D.C. durante sua primeira semana de governo para convencer as indústrias de tecnologia a se instalarem no México: “O México é o que as empresas americanas precisam”. Paralelamente, houve investimentos no desenvolvimento de parques industriais, na expansão da rede elétrica e nos sistemas de distribuição de água para operar essas instalações (Diario de Querétaro, 2024; Opportimes, 2025).
Portanto, a política estadual facilita a chegada de centros de dados graças a procedimentos simplificados de licenciamento e apoio integral em infraestrutura. A Secretaria do Desenvolvimento Sustentável (SEDESU), ocupada por Marco del Prete, atua como o principal elo com o setor empresarial, gerenciando tanto os investimentos quanto o impacto ambiental, facilitando a instalação das empresas: “Querétaro é um dos poucos estados em nível nacional que concentra em um único órgão a política econômica e a política ambiental” (Ocampo, 2025). A agência estabelece as licenças ambientais que a indústria deve cumprir, ou seja, centraliza a regulamentação, agilizando os processos e, ao mesmo tempo, impedindo a prestação de contas.
Assim, a partir da implantação de políticas neoliberais favoráveis ao mercado, vemos como o atual impulso à indústria de centros de dados reproduz os padrões históricos de subordinação do país na cadeia de valor da economia global. A integração do México no Tratado de Livre Comércio da América do Norte desde 1994, e posteriormente ao Tratado entre México, Estados Unidos e Canadá, assinado em 2018, acelerou um modelo de industrialização voltado para a manufatura, tornando-nos maquiladores de produtos. Na era atual, impulsionar em nosso território a indústria de centros de dados nos transforma em maquiladores da infraestrutura para a economia digital. Os dados são armazenados em nosso território, com um alto custo social e ambiental, reproduzindo as relações de subordinação na cadeia de valor dos dados e da inteligencia artificial. Enquanto os centros de dados se expandem em territórios periféricos, os lucros, a governança e o conhecimento permanecem concentrados em algumas poucas empresas, principalmente nos Estados Unidos. Ou seja, a narrativa da “vantagem competitiva” de Querétaro no nearshoring tenta justificar, na verdade, a inserção subordinada do México em cadeias de valor globais, agora digitalizadas, semelhantes aos esquemas extrativistas tradicionais (Brookings Institution, 2024; CEPAL, 2025).
As leis
Para possibilitar a expropriação, as políticas devem se sustentar em mecanismos legais. Os governos neoliberais do México, desde fins do século XX, desmantelaram o Estado por meio de privatização em massa de empresas nacionais e bens comuns (telecomunicações, energia, petróleo, água), o que permitiu a concentração de capital nas mãos de diferentes corporações nacionais e estrangeiras. No caso da água, duas leis permitiram a privatização do setor em Querétaro. Primeiro, a Lei de Águas Nacionais (1992) abriu as portas para concessões de exploração de águas a pessoas físicas e jurídicas, públicas e privadas. Em 2022, o Congresso de Querétaro aprovou a “Lei que regula a prestação de serviços de água potável, esgoto e saneamento do Estado”, que privatiza a operação do serviço por meio de concessões, contratos de obra ou parcerias público-privadas, com cobrança aos usuários e poderes para autorizar projetos hidráulicos (Lei das Águas Nacionais, 1992; Lei estadual da água, 2022). Ativistas e acadêmicos apontaram que essa lei não está alinhada com os padrões nacionais e internacionais e não se baseia em diagnósticos atualizados sobre o equilíbrio dos aquíferos ou a restauração das bacias hidrográficas (Aristegui Noticias, 2022; Contralínea, 2024).
No que diz respeito à energia, as reformas neoliberais de 1992, 2013 e 2014 abriram espaço para produtores privados e criaram uma concorrência desigual em detrimento da Comissão Federal de Eletricidade (CFE) (Villegas, 2021). Em 2024, a figura das “empresas produtivas do Estado” foi revertida. A CFE e a Pemex tiveram restituída sua natureza de entidades públicas, com um plano para expandir a geração e transmissão de energia (Presidência da República, 2024; El Economista, 2025).
No que diz respeito à posse da terra, a reforma constitucional de 1992 pôs fim ao compromisso pós-revolucionário do México com a redistribuição agrária, ao mesmo tempo em que legalizou a privatização dos ejidos, alterando de maneira fundamental a relação entre o Estado, o território e as comunidades rurais estabelecida na Constituição de 1917. A Lei Agrária de 1992 estabeleceu mecanismos que possibilitaram a privatização: o Artigo 56 concedeu às assembleias dos ejidos o poder de determinar o uso da terra e realizar o loteamento, enquanto os Artigos 81 e 82 estabeleceram os procedimentos para a adoção do “domínio pleno”, por meio do qual as terras dos ejidos podiam se tornar propriedade privada. Essa lei estabelece que “os governos estaduais e federal estimularão a reconversão, em termos de estrutura produtiva sustentável, a incorporação de mudanças tecnológicas e processos que contribuam para a produtividade e competitividade do setor agropecuário, para a segurança e soberania alimentares e para o uso otimizado das terras por meio de apoios e investimentos complementares” (Lei Agrária, 1992).
A reforma energética de 2013 representou igualmente uma perda dos direitos comunitários sobre a terra. Ao declarar o petróleo, a mineração e a eletricidade como setores de prioridade nacional, os ejidatários foram persuadidos a aceitar a intervenção do Programa de Certificação de Direitos Ejidais (PROCEDE) em seus ejidos, com o objetivo de conceder títulos de propriedade a cada ejidatário e permitir a venda ou o arrendamento de suas parcelas a empresas privadas (Vázquez-García e Sosa-Capistrán, 2021). A conversão de terras comunais, protegidas por seu valor ecológico, em propriedade privada é um processo de preparação territorial para a posterior acumulação capitalista.
A infraestrutura pública
Outro mecanismo de desapropriação é o aproveitamento da infraestrutura pública pelo setor privado. Pondo a infraestrutura pública a serviço das corporações, os governos facilitam uma privatização de fato. Isenções fiscais que reduzem a arrecadação para o erário público. Investimentos diretos em energia, água, vias e acesso a terras são feitos, para parques industriais onde os centros são instalados. Nesse esquema, os custos são socializados, enquanto os benefícios são privatizados.
As projeções setoriais estimam um crescimento acelerado do investimento em TI e IA durante 2024-2028, com uma demanda energética que poderia quadruplicar (Calderón, 2024). O governo estadual anunciou investimentos sem precedentes na rede elétrica (linhas de alta tensão, subestações) para atender à demanda da indústria (Diario de Querétaro, 2024). Na esfera federal, o Plano de Fortalecimento e Expansão do Sistema Elétrico Nacional 2025-2030 contempla projetos de geração e transmissão com a Comissão Federal de Eletricidade (CFE) como ator central (Presidência da República, 2024; El Economista, 2025).
As instituições
A subordinação das instituições públicas aos interesses das empresas privadas é outra das formas de incentivo à expropriação. São várias as instituições envolvidas em fazer crescer a indústrias dos centros de dados, sem regulamentação, sem controle e sem prestação de contas aos cidadãos. As instituições governamentais responsáveis por criar os marcos legais para o desenvolvimento dessa indústria garantem desde as licenças legais para sua instalação, os acordos sobre tributos, a posse de terras, o acesso à água e à energia elétrica. Por exemplo, além do governador, um ator proeminente tem sido a Secretaria de Desenvolvimento Sustentável (SEDESU), que tem negado repetidamente os impactos socioambientais dessa indústria emergente e não torna públicas as avaliações de impacto ambiental. Por outro lado, a Comissão Nacional da Água (CONAGUA), responsável pela concessão de licenças de uso da água e pelo estabelecimento de limites de consumo, obstrui o acesso a informações sobre o consumo de cada agente industrial. A Comissão Federal de Eletricidade, responsável pelas infraestruturas da rede elétrica, estabelecendo os usos e as condições de operação em nível federal, determina a capacidade de consumo que os parques industriais devem ter. A Secretaria da Reforma Agrária e o Registro Nacional Agrário são os responsáveis por garantir os processos de reconversão de terras.
As narrativas
“Querétaro está se posicionando na instalação de nuvens de dados graças à sua localização estratégica, segurança e respeito ao investimento”, afirmou o titular da SEDESU, Marco Antonio del Prete (Estrella, 2024). Segundo essa narrativa, Querétaro se apresenta como o estado mais conveniente para o investimento estrangeiro direto. Com uma perspectiva neoliberal, o governo de Mauricio Kuri, do PAN, se destacou por habilitar as condições legais, institucionais e infraestruturais necessárias para privilegiar o setor empresarial. O investimento estrangeiro direto se apresenta como um indicador de sucesso do governo (Reynoso, 2025).
Nesse esquema, a construção de narrativas que destacam o desenvolvimento econômico impulsionado pelos investimentos e o desenvolvimento da infraestrutura predominou nos últimos anos. Como mencionamos, o valor exato dos investimentos não é público, são mantidos em sigilo. Mas, a partir dos dados publicados, é possível estimar esse valor, de forma conservadora, em mais de US$ 13 bilhões.
Aplaude-se a chegada das grandes corporações tecnológicas. A presença dessas empresas, com centros de dados em hiperescala2, se materializou em Querétaro sobretudo nos últimos três anos. Em 2022, a Oracle iniciou a instalação de centros em hiperescala, seguida por vários outros empreendimentos. A Microsoft lançou em 2024 sua região “México Central” e o Google inaugurou sua região de nuvem em fins de 2024 (Figura 3).

A AWS anunciou um investimento plurianual com três zonas de disponibilidade (Microsoft News Center, 2024; DCD, 2024; El Financiero, 2025). Operadores como ODATA e CloudHQ também consolidaram sua posição no estado (DCD, 2025; ODATA Colocation, 2025a, 2025b). De acordo com declarações da ODATA, o centro de dados inaugurado no início de 2025 é o maior do México.
Apesar das narrativas triunfantes, a implantação dessa indústria em Querétaro se caracteriza pela opacidade corporativa, orquestrada com a opacidade governamental, que colocam em dúvida a realidade dos tão anunciados benefícios para a sociedade. Não existe um registro público e exaustivo que documente o número, a capacidade, as licenças, as avaliações de impacto ambiental, o consumo de energia e água dos centros de dados. Além disso, os acordos governamentais para isenção de impostos e cessão de terras, ou mesmo a quantidade real de empregos gerados por essa indústria, são ocultados do escrutínio público. As projeções relativas à criação de empregos, frequentemente acompanhadas de estimativas grandiloquentes sobre seus benefícios econômicos, carecem, até o momento, de evidências empíricas que as sustentem. E, infelizmente, esse é um padrão global.
Em Querétaro, os centros documentados pertencem a atores líderes nacionais, regionais e globais, embora os centros em hiperescala não estejam necessariamente registrados publicamente. No caso do Google, as informações sobre o investimento, a localização e a natureza do centro em hiperescala são totalmente restritas, “por razões de competitividade”, de acordo com declarações da companhia. Alguns esforços para documentar essas infraestruturas em nível global, como o Data Center Map, dependem de contribuições voluntárias e frequentemente estão incompletos ou desatualizados.
A acumulação por desapropriação
A indústria de centros de dados se soma à cadeia de processos de industrialização que provocaram a atual crise socioambiental. Nesta seção, apresentamos como essa indústria impacta as comunidades por meio da apropriação de bens comuns: água, energia, ar, terra.
A água
“Estamos enfrentando uma seca severa na cidade de Querétaro. É uma das primeiras cidades projetadas para ficar sem água”, relata Teresa Roldán, cofundadora do coletivo Voceras de la Madre Tierra, quando conversamos sobre a crise ambiental no estado. Teresa é uma incansável defensora do meio ambiente e da vida: “Tenho defendido as árvores, as áreas naturais protegidas, tudo na zona do parque — o que antes deveria ser o Parque Metropolitano — desde 2016”. O projeto do Parque Metropolitano foi abandonado após um boom imobiliário que reclassificou terras protegidas para que fossem utilizadas no desenvolvimento habitacional.
Em abril de 2025, o Monitor de Secas da Conagua indicava que 95% do território de Querétaro estava afetado (La Voz de Querétaro, 2025). A crise hídrica está levando o estado à beira do colapso ambiental e social. Antes da colonização, o território que hoje ocupa Querétaro era conhecido por seus rios e nascentes. No entanto, desde a invasão colonial, a terra e a água têm sido objeto de disputa. As decisões sobre o acesso à terra e à água têm favorecido, desde então, grupos de elite e interesses industriais em detrimento das comunidades locais, que foram deslocadas e despojadas de seus territórios e fontes de água (Valverde, 2009).
O aqueduto construído na época colonial (1726-1738), símbolo do patrimônio cultural de Querétaro e de sua identidade, é a memória monumental da relação do território com a água. O aqueduto foi construído para transportar água da nascente Capulín, em San Pedro de la Cañada, para fontes da cidade que abasteciam instituições religiosas e grupos privilegiados (Valdovinos & Romero, 2025). Celebrado como imponente obra de engenharia, na verdade tentava ocultar a causa de sua existência: a poluição do rio Blanco (hoje Querétaro) por causa dos resíduos das fábricas. Assim, enquanto a cidade era abastecida com água limpa, as comunidades indígenas vizinhas à fonte de água da Cañada ficavam com a água suja. É uma lógica muito semelhante à do futuro projeto El Batán, uma proposta do governo para que a água tratada seja usada para consumo humano, enquanto a água limpa vai para os centros de dados.
Há em Querétaro uma histórica apropriação de água para acumulação, derivada da imposição de um paradigma extrativista intensificado pela industrialização e integração regional da América do Norte desde a década de 1990 (Jacobo-Marín, 2024). O relatório Los millonarios del água (Os milionários da água) documenta que, a partir da Lei das Águas de 1992, cerca de 7% das concessões utilizam 70% do volume local de água (Gómez-Arias & Moctezuma, 2020). No estado, um pequeno grupo de concessionários concentra mais de 50 milhões de m³ de água por ano, enquanto mais de 100 mil residências não têm acesso à água encanada (INEGI, 2023; Saavedra Rivera & Martínez Ramos, 2024).
É difícil quantificar o consumo de água dos centros de dados, devido à opacidade corporativa e à complexidade metodológica de sua medição: deve-se considerar tanto o consumo direto, utilizado para sistemas de refrigeração, quanto o consumo indireto, associado à geração da eletricidade necessária para operá-los. Em contextos de estresse hídrico – como o de Querétaro –, o volume de água extraído tem impactos maiores do que os que causaria um volume idêntico em contexto menos estressado.
Embora algumas empresas declarem utilizar sistemas de refrigeração a ar em suas instalações, como a ODATA (BN Americas, 2025), ou estratégias “positivas em água”, elas não publicam seus dados sobre Eficiência no Uso da Água (WUE, na sigla em inglês). Além disso, a verificação independente é limitada. O governo estadual é outro obstáculo para o cálculo do consumo de água, já que favorece a instalação de centros em parques industriais. Como a gestão da água é feita por meio da transferência de concessões da CONAGUA e alocações dentro desses parques, o volume total de recursos comprometidos fica oculto. As autoridades rejeitam pedidos para tornar transparentes os volumes atribuídos a cada empresa, o que alimenta a desconfiança pública.
Devemos levar a sério a lição que nos deixa o caso de Querétaro. O México está passando por uma das secas mais generalizadas e intensas das últimas décadas. De acordo com a CONAGUA, em 2023, cerca de 80% do território mexicano enfrentou condições de seca (Figura 4). A crise hídrica em Querétaro antecipa o que está por vir para o país. A previsão é de que o México se torne um dos países com maior estresse hídrico do planeta (World Resources Institute, 2023).

A energía
A demanda energética dos centros de dados é crítica e tem relação direta com o consumo indireto de água. Querétaro tem um déficit energético estrutural e um crescimento da demanda superior à média nacional, com o setor industrial consumindo cerca de 70% da capacidade instalada (Governo do Estado de Querétaro, 2023). De acordo com dados do México Evalúa (2024), o consumo de eletricidade em Querétaro cresceu de 4.923.884 MWh em 2015 para 5.039.836 MWh em 2022, com um aumento de 33,59% no número total de usuários. Este crescimento na demanda pré-existente, somado às necessidades energéticas dos centros de dados, levanta questões sobre a capacidade do sistema elétrico estadual (Figura 5).

Estima-se a capacidade energética instalada/projetada de Querétaro em 690 MW, o que projeta a necessidade de mais 1490 MW nos próximos anos. É importante lembrar que, no México, os combustíveis fósseis representam quase 80% do fornecimento energético primário (Ministério da Energia, 2024).
De acordo com a Associação Mexicana de Centros de Dados, “o México dispõe de boa conectividade que permite uma latência mínima, mas precisa de mais mão de obra especializada, custos competitivos tanto de energia quanto de fontes renováveis e um marco regulatório transparente, simples e estável, bem como disponibilidade de mais terrenos industriais com acesso à energia” (https://asmexdc.com/la-asociacion/), o que se traduziu em uma política do Estado.
Os relatos sobre falhas elétricas em vários bairros de Querétaro tornaram-se frequentes (González, 2025). De 2014 a 2023 registrou-se um aumento de 151% nas falhas (Santoyo, 2023). Juntamente com o problema da água, essas falhas evidenciam a fragilidade do sistema elétrico estadual. A situação levanta sérias questões sobre as prioridades na distribuição de recursos energéticos e a equidade no acesso a serviços básicos.Enquanto se garante o fornecimento estável para as atividades corporativas, as comunidades vizinhas enfrentam interrupções frequentes e deficiências no fornecimento de eletricidade (Diario de Querétaro, 2024). As promessas de operar os centros de dados com energias renováveis requerem um escrutínio rigoroso para evitar o greenwashing e a avalição dos impactos territoriais e sociais associados aos projetos de geração e transmissão necessários para abastecer essas instalações.
O ar
Está demonstrado que os centros de dados contribuem para as emissões de CO² e a poluição do ar devido ao uso de combustíveis fósseis e ao consumo de energia. Os geradores a diesel de reserva utilizados por essas instalações emitem partículas finas PM₂.₅ e óxidos de nitrogênio (NOₓ), substâncias com efeitos adversos comprovados sobre a saúde humana, especialmente em áreas periféricas e urbanas onde os centros de dados costumam estar localizados (Gradient Corporation, 2024; ABA, 2024).
As previsões desses impactos não são animadoras. Em nível global, estima-se que os centros de dados consumam cerca de 415 TWh, mas as projeções indicam que esse número pode dobrar até 2030 (IEA, 2025), ultrapassando até mesmo as indústrias mais poluentes. Diante do rápido crescimento da IA, aumentará a demanda energética e, com ela, crescerão as emissões associadas ao seu desenvolvimento, implementação e uso (RMI, 2024).
Embora não existam estudos locais específicos que quantifiquem as emissões de PM₂.₅ e NOₓ dos centros de dados em Querétaro, a partir de relatórios internacionais que alertam que as emissões dos geradores de reserva são relevantes para a qualidade do ar e a saúde humana, é plausível que os geradores em operação periódica adicionem uma carga poluente local significativa. Já se alertou para as consequências para o meio ambiente e os riscos para a saúde decorrentes da geração de eletricidade no Vale do México com usinas energéticas altamente poluentes (Energía a Debate, 2017a, 2017b). Embora existam cinco monitores na Zona Metropolitana de Querétaro e um em San Juan del Río, eles não cobrem todas as áreas onde os centros de dados estão instalados atualmente (https://aire.cemcaq.mx). A falta de vigilância regulatória (Juárez, 2024) e de um tratamento diferenciado dos centros de dados como indústria reforçam a invisibilidade do tema.
A terra
A expansão de parques industriais e campus de centros de dados em Querétaro pressiona zonas de recarga hídrica e áreas anteriormente destinadas à conservação ecológica ou ao uso comunitário, transformando o uso do solo para a indústria e fragmentando os ecossistemas. Essa transformação ameaça não apenas a biodiversidade, mas também as formas comunitárias de vida e os sistemas tradicionais de governança do território. Como resultado da Revolução de 1910, o México guarda uma singularidade: mais da metade de seu território é de propriedade social, organizada em ejidos e comunidades agrárias, que oferecem um marco legal para a posse coletiva e a gestão dos recursos. No entanto, desde as reformas constitucionais de 1992 que permitiram sua privatização, empresas incorporadoras e entidades governamentais têm cada vez mais visado essas terras para uso industrial. A política neoliberal que promoveu a transformação territorial, em detrimento das comunidades e em favor da industrialização e do setor imobiliário, é uma das causas da crise ecológica do estado.
Querétaro conta com mais de 360 ejidos, que representam aproximadamente 55% das terras cultivadas (Código Informativo, 2020). Em 1992, as reformas constitucionais permitiram a privatização das terras ejidais, criando vulnerabilidades estruturais para a apropriação territorial. Investigações jornalísticas documentam uma “máfia agrária” que explora vulnerabilidades legais para se apropriar de terras comunais por meio de falsificação de documentos e corrupção notarial (InformativoQ, 2021).
No caso de Cerro Prieto, uma localidade do município de El Marqués, a terra foi expropriada por meio de procedimentos legais questionáveis que fabricaram falsos ejidatários para justificar a venda (EJAtlas, 2022). Quase imediatamente após a transferência, poços foram perfurados, tubulações e infraestrutura foram instaladas para apoiar futuros empreendimentos residenciais e industriais. Ativistas que se opõem à expropriação de terras e ao desvio de água foram criminalizados, presos e torturados sob falsas acusações de invasão de terras e distúrbios públicos.
Como mencionamos anteriormente, o governo de Mauricio Kuri utiliza diversas ferramentas legais para facilitar o acesso corporativo ao território. Os fundos fiduciários permitem a obtenção da propriedade da terra, em troca de compromissos de investimento, enquanto a integração em parques industriais aproveita a infraestrutura já disponível, com zoneamento e licenças ambientais previamente aprovadas, agilizando o processo de instalação dos centros de dados.
A área ocupada pelos centros de dados é estimada em 975.079 mil m² (soma dos terrenos com metragem publicada). Além disso, foram autorizados até 300 hectares para novos parques na região, estrategicamente localizados em municípios como El Marqués, Colón e San Juan del Río (Galván, 2024). (Figura 6)

Em poucos casos é possível documentar os processos de reconversão de cessão de terras para a construção de centros de dados. Na maioria das ocasiões, eles ficam invisíveis, seja pela sucessão dos diferentes momentos da reconversão, seja porque são ocultados por “segredo corporativo”. A organização Micelio Urbano documenta a substituição sistemática de milpas (policultivos tradicionais, originários do período pré-hispânico) por infraestrutura de centros de dados, reorganizando os ambientes socioecológicos em função das necessidades de acumulação de capital (Ecoosfera, 2024).
No caso da CloudHQ, o estado aprovou um fundo fiduciário que contribuiu com um terreno de 518.470 m² – avaliado em cerca de US$ 17,7 milhões – para um campus de 288 MW, com um investimento estimado em US$ 3,4 a US$ 4,0 bilhões (Butler, 2023). O caso Digital Realty MEX03 é a evidência mais direta vinculando um centro de dados a uma parcela ejidal específica: “Parcela 10 Z-1 P1/1 do Ejido San Vicente”. Isso implica (por lei) que deveria ter havido uma ata de assembleia aprovando o loteamento e, se fosse o caso, a adoção do domínio pleno e o registro no RAN antes da alienação.
Em Purísima de Cubos, há uma cadeia documental municipal e estadual (2017-2024) que transforma terras comunais em loteamento industrial (“Novotech Aeropuerto”), o que sugere processos de parcelamento/domínio pleno. O domínio pleno é um mecanismo legal pelo qual uma parcela ejidal que originalmente pertence ao núcleo ejidal se torna propriedade privada do ejidatário. A parcela deixa de pertencer ao regime ejidal e passa para o direito civil, o que permite vendê-la, arrendá-la, hipotecá-la, dividi-la, herdá-la, incluí-la em uma sociedade ou usá-la como garantia (Lei Agrária, 1992, artigos 81, 82 e 83).Não há dados disponíveis sobre a ocupação das terras onde se encontram os centros de dados da Microsoft, Amazon e Google. No entanto, é possível realizar um exercício para encontrar indícios da reconversão de terras comunais no polígono onde se encontram esses clusters. A Tabela 2 mostra os instrumentos públicos que revelam quais núcleos ejidais correspondem aos polígonos onde hoje se concentram os centros de dados em Colón, Querétaro, e se há indícios de adoção de domínio pleno. Por meio desse mecanismo, converteram-se terras ejidais em propriedade privada. Por essa razão, o acompanhamento dos processos de concessão de domínio pleno pode servir como indício da privatização de terras e sua destinação à indústria de centros de dados. Apresentamos essa sistematização como uma primeira aproximação a esse eixo de análise; no entanto, estudos futuros exigem múltiplas solicitações de informações públicas que permitam traçar o caminho da privatização da terra comunal.
Núcleo / Parcela | Instrumento (tipo) | Data | O que o instrumento acredita | Relação com centros de dados |
---|---|---|---|---|
Ejido Purísima de Cubos – Parcela 59 Z-1 P1/1 (Código cadastral 05 04 061 66 410 059) | Gazeta Municipal de Colón n.º 66, Tomo I (Acordo do Conselho Municipal: relotificação/ampliação “Novotech Aeroporto”; MIA e aprovações prévias) | 17 de setembro de 2024 | Localização exata (Camino a San Vicente 949), superfície, histórico de licenças (2017–2024), incorporação de etapas do loteamento industrial | Parque industrial onde foram instalados/comercializados lotes para centros de dados perto do Aeroporto Internacional de Querétaro. |
Ejido Purísima de Cubos – Parcela 63 Z-1 P1/1 (Código cadastral 05 04 06 166 410 063) | Gazeta Municipal de Colón n.º 66, Tomo I (autorização de ampliação – Etapa II “Novotech Aeroporto”) | 17 de setembro de 2024 | Incorpora 77.836,55 m²; detalha porcentagens de uso (industrial, vias etc.) | Mesma zona do cluster de centros de dados. |
Ejido Purísima de Cubos – Parcela 59 Z-1 P1/1 | Ata da Câmara Municipal (sessão ordinária) que antecede a Gazeta 66 | 27 de agosto de 2024 | Reitera MIA (SEDESU/132/2018), EIU/EIV 2018, autoabastecimento de água, uso “Indústria leve” | Fundamento administrativo prévio |
Ejido Purísima de Cubos – Parcela 59 Z-1 P1/1 | Gazeta Municipal n.º 43, Tomo I (antecedentes) | 21 de julho de 2020 | Área total 77.874,054 m²; viabilidade elétrica CFE; autoabastecimento de água etc. | Histórico do projeto industrial que possibilita a chegada dos centros de dados. |
Ejido San Vicente – Parcela 10 Z-1 P1/1 | Ficha oficial do local “MEX03” (Digital Realty) | s/f (em vigor) | A direção corporativa declara explicitamente “Parcela 10 Z-1 P1/1 do Ejido San Vicente, 76295 Colón” | Vincule um centro de dados operacional a uma parcela ejidal específica. |
Núcleos em Colón: Purísima de Cubos, Noria de Cubos, San Vicente El Alto | RAN – “Núcleos Agrários que adotaram Domínio Pleno (desagregado)” | Documento em vigor | Lista de núcleos de Querétaro com adoção de domínio pleno (base para localizar atas e folhas no RAN) | Indicio de adopción de dominio pleno en los núcleos donde están los parques/centros de datos. |
Localização estadual de publicações | Índice 2025 do Jornal Oficial La Sombra de Arteaga | 2025 | Referências a acordos publicados que envolvem as parcelas 59 e 63 do Ej. Purísima de Cubos | Rastreabilidade dos acordos no jornal estadual |
A defesa histórica da água, da vida e do território

As lutas pela água, pela vida e pelo território no México vêm de longa data, enfrentando políticas de desapropriação e privatização dos bens comuns. Essas resistências se expressam na defesa ativa do direito a uma vida digna e se sustentam em práticas comunitárias baseadas no cuidado, na reciprocidade e na organização coletiva. Diversas comunidades têm desenvolvido processos coletivos de organização local e regional em resposta à expropriação sistemática e à devastação de seus territórios, recursos hídricos e formas de vida. Essas ações, que vão desde a defesa jurídica e a mobilização comunitária até a recuperação de formas ancestrais de gestão da água, constituem práticas de resistência contra a racionalidade extrativista imposta tanto por interesses privados quanto estatais. Essas iniciativas promovem alternativas autônomas e sustentáveis que desafiam a lógica da mercantilização da água e do território e reivindicam seu caráter sagrado e comunitário (CNI, 2024).
Os movimentos indígena e camponês sustentam há décadas sua resistência e suas formas de articulação política, contra a violência da expropriação sistemática que enfrentam. O Congresso Nacional Indígena (CNI), que representa 523 comunidades pertencentes a 43 povos indígenas em 25 estados, coordena a defesa territorial contra megaprojetos e indústrias extrativas (CNI, 2017). Desde 2022, o CNI organiza a Assembleia pela Água e pela Vida, que reúne os diversos movimentos em defesa da Água, da Vida e do Território.
Outras iniciativa é a Coordenadora Nacional Água para Todos, Água para a Vida lançada em 2012 por iniciativa de pesquisadores, coletivos e ativistas como um espaço que conecta as lutas locais de base contra a privatização, a contaminação dos recursos hídricos, os povos indígenas e os movimentos populares urbanos a favor do acesso aos recursos hídricos e do controle local. A Coordenadora elaborou e promoveu uma Iniciativa Cidadã de Lei Geral da Água que confronta diretamente o atual marco jurídico neoliberal. Sua proposta incorpora princípios de gestão democrática, justiça distributiva, prioridade do uso comunitário e doméstico, proteção integral de bacias hidrográficas e ecossistemas, bem como mecanismos de controle social e descentralização. A iniciativa afirma a água como um direito humano e um bem comum e apresenta alternativas à gestão centralizada e opaca do recurso, questionando os interesses corporativos e estatais que se beneficiam do modelo atual (Moctezuma, 2020).
Em Querétaro, grupos indígenas, camponeses e coletivos e organizações da sociedade civil empreenderam múltiplas ações de resistência contra os processos de desapropriação da água e do território. É necessário destacar que a denúncia contra os centros de dados se insere nessa luta de longa data e que, portanto, seria inadequado falar de uma resistência específica ou exclusiva contra essas infraestruturas. Um dos exemplos dessa antiga resistência no estado é a luta do povo otomí, habitante do território desde antes da chegada dos colonizadores e com papel proeminente na constituição do que hoje é Querétaro (Figura 8).

A vigência das reivindicações do povo otomí contra a expropriação da água e do território demonstrou-se quando da aprovação da Lei Estadual da Água em 24 de maio de 2022 pela LX (60ª) Legislatura de Querétaro, que permite a concessão do abastecimento de água a empresas privadas por até 40 anos. Considerando a concessão uma privatização dissimulada (Torres-Mazuera, 2023; Bernal, 2024), a comunidade respondeu com mobilizações e fóruns, e denunciou que, enquanto os loteamentos e as empresas nunca sofriam cortes de água, os bairros populares e a comunidade otomí sofriam escassez, repressão e cobranças injustas (Pie de Página, 2022). Em 1º de agosto de 2022, um tribunal federal concedeu uma liminar (907/2022) a favor da comunidade otomí, concluindo que a Lei das Águas violava os direitos indígenas reconhecidos pela Constituição (artigos 1, 2, 27) e por tratados internacionais, além de não ter sido posta sob consulta das comunidades afetadas. No entanto, a CONAGUA e a CEA mostraram-se relutantes em cumprir as restituições acordadas (Vázquez Cabal, 2024).
Uma das organizações mais visíveis e ativas é a Voceras de la Madre Tierra, fundada por Teresa Roldán. A Voceras promove a proteção das zonas de recarga natural, denuncia as expropriações ilegais de terras e documenta a degradação ambiental por meio das redes sociais, ações diretas e denúncias legais. Roldán e outras ativistas foram excluídas de reuniões públicas onde são tomadas decisões sobre infraestruturas críticas. Em alguns casos, elas foram até mesmo retiradas à força de espaços públicas, apesar de existirem disposições legais que garantem a participação cidadã na governança ambiental.
O movimento tem sofrido ataques constantes, tanto retóricos quanto físicos. Roldán foi vítima de tentativas de agressão, e suas aliadas comunitárias em Escolásticas, um povoado do município de Pedro Escobedo, foram presas arbitrariamente e torturadas. Em 2023, durante um protesto contra a chamada Lei de Concessões de Água, onze manifestantes foram presos e espancados, e um jovem ficou à beira da paralisia devido à violência sofrida. A resposta do Estado tem sido, em grande parte, o silêncio, mesmo depois de Roldán ter falado perante a Suprema Corte de Justiça em um fórum sobre o Acordo de Escazú, um tratado internacional que garante aos defensores ambientais o direito de participar das decisões ambientais. Apesar da apresentação de denúncias formais e recomendações de políticas públicas à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, bem como da aceitação oficial dessas recomendações pelas autoridades estaduais, reconhecendo as violações, até agora nenhuma instituição federal ou estadual emitiu uma resposta substantiva às reivindicações das Voceras.
As ações das Voceras de la Madre Tierra articulam demandas de direitos humanos (acesso à água), transparência governamental, regulamentação corporativa rigorosa e reconhecimento da soberania territorial indígena. Sua intervenção perante a Suprema Corte em julho de 2024 marca um precedente de judicialização de conflitos hídricos-tecnológicos no México.
No entanto, as ações sistemáticas de agressão e coerção contra os movimentos de defesa da água, da vida e do território, bem como contra as organizações ambientalistas, evidenciam que as elites econômicas e políticas não estão dispostas a desistir facilmente de sua apropriação indevida da terra e da água. Elas também mostram que essas agressões são atravessadas por dimensões de raça, gênero e status social. Quem costuma estar na linha de frente da defesa são, em sua maioria, mulheres; no caso das comunidades, além disso, são pessoas pertencentes a povos indígenas que vivem em condições precárias, sem acesso aos direitos básicos.
A organização social continua sendo o único mecanismo para denunciar a expropriação sistemática enfrentada pelas comunidades e pessoas que habitam territórios historicamente saqueados desde a colônia, hoje submetidos à lógica da pilhagem digital.
Conclusão
O caso de Querétaro demonstra que os centros de dados – frequentemente apresentados como indicadores de digitalização, modernização e desenvolvimento econômico – estão profundamente entrelaçados com histórias de desapropriação territorial, degradação ambiental e conluio entre o Estado e o capital. Sua presença material reconfigura paisagens territoriais e sociais, concentra poder material e informacional e reforça modos coloniais e capitalistas de acumulação. As consequências socioambientais resultantes, suportados de forma desproporcional por comunidades historicamente marginalizadas, revelam as lógicas profundamente desiguais das infraestruturas de dados.
A abordagem ecológico-política situa as infraestruturas dentro de seus contextos socioecológicos mais amplos. Ela tem como focos as experiências encarnadas daqueles que são afetados pela infraestrutura, os múltiplos impactos do desenvolvimento tecnológico e as economias políticas que moldam quais infraestruturas são construídas, onde, para quem e a que custo. Essa perspectiva exige atenção analítica e política nos valores incorporados no projeto (desenvolvimento, operação e governança das infraestruturas) e nas possibilidades de resistência a partir da base, e de reconfiguração sociopolítica e infraestrutural.
À medida que a crise civilizacional se intensifica, a economia digital cresce e os regimes autoritários se fortalecem, torna-se cada vez mais urgente questionar como as infraestruturas mediam as relações sociais, moldando as condições materiais e imateriais necessárias para sustentar a vida. Reimaginar infraestruturas eco políticas se conjuga com ampliar práticas de cuidado, de justiça e de sustentabilidade, que já estão, de fato, criando infraestruturas alternativas para a sobrevivência. Isto requer reconhecer as comunidades não como receptoras passivas da mudança infraestrutural, mas como agentes ativos na construção de futuros infraestruturais dignos.
Notas
1 ^ Os números existentes sobre a situação do setor são dinâmicos, envolvem inúmeras variáveis e, por vezes, não há dados ou estes são imprecisos. Neste caso, os totais agregados sobre o montante do investimento (imediato, a curto, médio ou longo prazo), a área ocupada (total e técnica) e a capacidade em MW (inicial e final) são calculados a partir das informações publicadas em diferentes meios de comunicação. No entanto, há inconsistências nos dados disponíveis, o que significa que as estimativas podem variar. Os números apresentados neste caso são referências. Os dados ausentes devem-se ao fato de as empresas não terem divulgado as informações.
2 ^ Um centro de dados em hiperescala é uma instalação de grande dimensão, com capacidade para alojar mais de 5000 servidores em áreas superiores a 930 m². Estas infraestruturas exigem elevados níveis de energia (100 MW ou mais) e são concebidas com uma arquitetura modular e escalável que lhes permite crescer de acordo com a procura. Incorporam redundância e automação crítica para garantir a continuidade operacional, bem como alta eficiência e integração tecnológica entre seus sistemas de computação, rede e armazenamento.
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